Cientistas demonstraram experimentalmente que pedaços de metal têm a capacidade de trincar e depois se fundir novamente, desafiando teorias científicas fundamentais sobre o processo de fadiga e fratura dos metais. Essa descoberta pode levar a uma revolução na engenharia, com materiais que se autocuram, tornando objetos metálicos mais seguros e duráveis. Embora ainda haja muito a ser compreendido, a pesquisa tem revelado novas possibilidades intrigantes.
Cientistas demonstraram experimentalmente que pedaços de metal têm a capacidade de trincar e depois se fundir novamente sem qualquer intervenção humana, desafiando teorias científicas fundamentais sobre o processo de fadiga e fratura dos metais.
A pesquisa sobre o desenvolvimento de materiais que se autocuram após serem danificados tem sido uma área muito ativa, especialmente em relação aos materiais macios, como os poliméricos, sendo os hidrogéis os mais promissores para aplicações biomédicas.
No entanto, os resultados até o momento só haviam sido obtidos com materiais macios, e a capacidade de autocura em metais representa uma descoberta significativa. Se esse processo de cicatrização puder ser controlado e aplicado aos metais, poderá desencadear uma verdadeira revolução na engenharia. Imagine, por exemplo, pontes, motores e aviões que possam reverter danos causados pelo desgaste, tornando-os mais seguros e duráveis.
A fadiga é uma das principais razões pelas quais máquinas e dispositivos metálicos se desgastam e eventualmente quebram. A aplicação repetida de tensão ou movimentos causa a formação de trincas microscópicas, que com o tempo se propagam e resultam em falhas catastróficas.
Com a capacidade de autocura dos metais, esse destino aparentemente inexorável pode ser alterado, permitindo que objetos metálicos recuperem sua integridade mesmo após danos por fadiga em escala nanométrica.
Brad Boyce, do Laboratório Nacional Sandia, nos Estados Unidos, descreveu a experiência como “absolutamente impressionante de assistir em primeira mão”. A pesquisa confirmou que os metais possuem uma capacidade intrínseca e natural de se curar, pelo menos no caso de danos por fadiga em nanoescala.
A descoberta da autocura de metais começou em 2013, quando Guoqiang Xu e Michael Demkowicz demonstraram pela primeira vez que um metal trincado poderia se reparar por si só.
Na ocasião, eles atribuíram sua descoberta a um fenômeno chamado disclinação, onde grânulos da microestrutura cristalina do metal interagem com uma trinca, movendo-se pelo material. Contudo, o que ainda não era totalmente compreendido era que, sob certas condições, esses grânulos poderiam se deslocar e migrar, fechando a trinca.
Mais recentemente, o pesquisador Christopher Barr conduziu um estudo sobre a propagação de trincas em metais, submetendo um pedaço de platina a 200 dobras por segundo e filmando o processo com um microscópio eletrônico especializado.
Para sua surpresa, cerca de 40 minutos após o início do experimento, a trinca, que inicialmente estava se alargando, mudou de curso. Uma das extremidades da rachadura se fundiu, como se fosse um filme sendo reproduzido ao contrário, sem deixar vestígios da trinca anterior – foi uma espécie de soldagem a frio.
Ao prosseguir com o experimento, a trinca voltou a aparecer, mas dessa vez cresceu em uma direção diferente, desafiando novamente as expectativas. Segundo as previsões, uma parte previamente submetida à fadiga deveria ser mais frágil e, portanto, mais suscetível a uma nova quebra.
Demkowicz, que também faz parte da equipe de pesquisa, utilizou os dados obtidos e simulou o experimento em um modelo de computador que havia desenvolvido em 2013, confirmando que o comportamento de autocura do metal observado agora é consistente com a teoria das disclinações que ele havia descrito anteriormente, corroborando suas conclusões anteriores.
A descoberta inesperada da autocura em metais desencadeou um longo trabalho de pesquisa para compreender em detalhes as condições que permitem esse fenômeno, verificar se ele se aplica a todos os metais e, o mais importante, investigar a possibilidade de controlar esse processo para obter vantagens práticas.
“O alcance de generalização dessas descobertas provavelmente será um tema de extensa investigação”, afirmou Boyce. “Nós demonstramos esse fenômeno ocorrendo em metais nanocristalinos no vácuo, mas ainda não sabemos se ele também pode ser induzido em metais convencionais em condições atmosféricas normais.”
Apesar das incertezas que permanecem, uma coisa é certa: o conhecimento anterior sobre a fadiga, quebra e comportamento dos metais não estava completo.
“Minha esperança é que essa descoberta inspire os pesquisadores de materiais a considerar que, sob circunstâncias específicas, os materiais podem manifestar comportamentos surpreendentes e inesperados”, concluiu Demkowicz.
(Engenhariae)