Criptomoeda Worldcoin é oficialmente lançada. E já há mais de quatro milhões nas carteiras dos portugueses

By | 24/07/2023

Ao longo de quase dois anos, mais de 170 mil portugueses concordaram trocar um registo das suas íris por 25 unidades de uma criptomoeda que não existia, mas alguém lhes prometia que viria a existir. Nesta segunda-feira, essa promessa torna-se numa realidade – a Worldcoin anunciou oficialmente o lançamento da criptomoeda do projeto (com o mesmo nome e a designação WLD).

“É o dia pelo qual todos esperávamos e para o qual andamos a trabalhar. Na prática, vamos disponibilizar finalmente o token a toda a gente. O protocolo vai passar de uma fase beta [de testes] para uma fase live [de disponibilização no mercado], o que significa que toda a gente que se registou até agora vai poder materializar os tokens que fomos distribuindo”, explicou Pedro Trincão, líder da Worldcoin para Portugal e Espanha, numa entrevista de antecipação ao lançamento à Exame Informática.

De forma resumida, a Worldcoin é uma startup que está a tentar resolver diferentes problemas com um único projeto. Quer, por um lado, criar uma criptomoeda que seja de acesso e utilização universal. Quer, por outro, criar um sistema de verificação de identidade e humanidade, chamado WorldID. E pelo caminho também se propõe a, quem sabe, resolver o desafio de arranjar um método que permita distribuir um rendimento básico universal por um grande número de pessoas.

Desta vez, o foco do anúncio está na criptomoeda. Durante vários meses, os utilizadores que se registaram na Worldcoin receberam 25 unidades da criptomoeda. Mais à frente, a empresa mudou um pouco as regras – em vez de dar duas unidades e meia da divisa digital, por semana, até atingir um patamar máximo de 25 unidades, passou a atribuir aos novos utilizadores uma unidade da moeda por semana, mas sem um limite máximo de moedas.

A verdade é que com a simples promessa de transferência de algumas worldcoins para uma carteira digital, a startup, que foi cofundada por Alex Blania, Max Novendstern e Sam Altman (este último, também cofundador da OpenAI, a empresa por trás do ChatGPT), conseguiu já atingir dois milhões de utilizadores a nível global e 170 mil em Portugal. Um número que tem crescido de forma veloz: no final de outubro do ano passado eram apenas 60 mil os utilizadores registados; em abril eram 130 mil.

Worldcoin | WorldID
Para fazerem o registo na Worldcoin, os utilizadores têm de permitir a digitalização das íris dos seus olhos por uma esfera espelhada, criada por um antigo designer da Apple (Thomas Meyerhoffer) e batizada de Orbe.

Isto significa que, mais moeda, menos moeda, com o lançamento desta segunda-feira já existem mais de quatro milhões de unidades da Worldcoin nas carteiras digitais de 170 mil utilizadores portugueses.

A empresa pretende ainda recompensar os utilizadores mais antigos – aqueles que acreditaram desde o primeiro momento que a promessa de uma nova moeda digital seria mais do que isso – atribuindo-lhes mais unidades da criptomoeda, os chamados “genesis grant” (que deverão ser 25 unidades extra, ainda que o valor não esteja definido, afirma Pedro Trincão).

Worldcoin: Uma nova fase

Nem sempre tudo correu de feição à Worldcoin – basta recordar que o lançamento da criptomoeda esteve prometido para 2022 e que a empresa chegou inclusive a traçar uma meta ambiciosa de ter mais de mil milhões de utilizadores antes do arranque deste ano.

Talvez por isso o lançamento desta segunda-feira está a ser apelidado internamente pelos membros da Worldcoin como o “início”. Isso significa que mesmo com a materialização do token WLD, e, por isso, o marcar de um ponto importante na vida da Worldcoin – o lançamento oficial da moeda digital associada ao projeto –, ainda há várias questões que estão por definir. E há mais cautela no discurso de sucesso do projeto. Pedro Trincão disse não saber em quantos, ou quais, mercados de compra e venda de criptomoedas (exchanges) estará este token disponível. E também não comentou as expectativas da startup sobre o potencial valor de mercado que a divisa digital poderá alcançar. “Não posso especular. A minha equipa legal dava-me um tiro”, brinca, para mais tarde acrescentar num tom mais sério: “Não vamos estar obcecados com o valor do token”.

Apesar de ainda não ser certo se haverá mercados que vão suportar a moeda (o que é pouco provável, devido ao alto perfil mediático do projeto), os utilizadores poderão, por agora, fazer transferências de fundos entre si. E se (ou quando) a Worldcoin for listada num exchange, até poderão trocar as moedas que receberam por dinheiro fiduciário (como euros e dólares).

E agora que essa é uma possibilidade, a de trocar as worldcoins por euros, Pedro Trincão acredita que isso se traduzirá num maior interesse do público pelo projeto. “A expectativa é que tendo o token disponível e sendo ele transacionável, traga um interesse diferente. A nossa expectativa é essa, vai facilitar o trabalho das equipas no terreno”, detalha.

Questionado se com este lançamento a startup manteve algum contacto com os reguladores do setor financeiro (Banco de Portugal e Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), Pedro Trincão diz que não houve contacto entre as partes. “No início, o Ricardo [Macieira, líder europeu de expansão da Worldcoin], interagiu com a Comissão Nacional da Proteção de Dados, foi explicar o projeto, mas com a CMVM e o Banco de Portugal acabamos por não interagir. Não fugimos disso, temos gosto em fazê-lo – e se calhar vai acontecer no futuro próximo”, adianta.

Havendo uma componente financeira envolvida agora no projeto, isso significa que tornar-se-á, possivelmente, num isco usado por burlões e pessoas mal intencionadas para enganar outras pessoas. A Worldcoin diz que, a nível global, já foram detetados alguns casos (como utilizadores que alegavam ter acesso antecipado à moeda e queriam lucrar com isso), mas que existe uma equipa de segurança que monitoriza os casos para tentar dar-lhes uma resposta o mais rápido possível. “Temos conseguido resolver a maior parte dos problemas. (…) A tecnologia está muito robusta e se não estivéssemos preparados, não o faríamos [o lançamento]”, garante o responsável para o mercado português.

De Portugal para o mundo

E aquilo que a empresa fez por cá durante cerca de dois anos – pensar em conceitos e testá-los – vai agora começar a ser exportado para outros países. “Desde onde vamos montar as bancas, que bancas vamos montar, como as orbes funcionam, se em espaço aberto, com ou sem luz, com ou sem router”, exemplifica Pedro Trincão, foi tudo trabalho em Portugal, que tem sido um dos mercados prioritários da tecnológica norte-americana.

Além do lançamento da Worldcoin, a startup está a anunciar nesta segunda-feira uma expansão internacional, para um total de 35 cidades em 20 países (até agora só marcava presença em sete países).

Já para o mercado português, Pedro Trincão anunciou a abertura de novos postos de inscrição de utilizadores (dois no Porto e um no Algarve) e que está a ser preparado um novo projeto que tenciona levar a Worldcoin a mais locais em Portugal, através da integração de uma Orbe (o dispositivo esférico espelhado que faz a digitalização das íris) numa mota.

“Até agora temos montado a operação, está relacionado com as bancas de referência, onde temos sítios com muito tráfego pedonal e que seja de fácil acesso, mas ainda assim continuamos a não chegar a todas as pessoas. Vamos fazer este teste, o primeiro protótipo do mundo é cá, para depois fazermos uma visita por universidades e outros distritos”, revela.

(Exameinformatica)